quinta-feira, 30 de junho de 2011

Cidade dos sonhossustentabilidade, meio ambiente, vidsa india

Ao consumidor ocidental, o "shopping" pode parecer tímido porque não prima pela variedade. Coisas demais parecem, aos olhos daquela gente, uma armadilha que estimula o apetite pelo supérfluo. Em Auroville, evitam-se os excessos.

Isso não quer dizer que as pessoas sejam despidas de vaidade. "É fascinante ver as indianas trançando os cabelos, pintando as unhas, se enfeitando de flores", diz Ruth. "A estética faz parte dos valores locais", afirma a designer. "Fiquei numa pousada em estilo japonês, bem construída, com roupa de cama boa, comida benfeita, bela arquitetura", diz. "Se você é uma manifestação do divino, que é perfeito, você tem de buscar a perfeição em todas as dimensões", afirma Marco Schultz, traduzindo o apreço pela estética que está no cerne do projeto.

ESTE É O CAMINHO
Ali, vive-se na contramão do capitalismo. Crescer não é a prioridade. Não há pressa inclusive para implantar o conjunto arquitetônico concebido por Aurobindo, ainda bem incipiente. Qualidade de vida, isso sim é uma aspiração imediata. A aprendizagem desses caminhos está nas palavras da Mãe, a francesa Mirra Alfassa, companheira espiritual de Aurobindo, que, fascinada por suas ideias, fez erguer o projeto depois da morte do mestre. Há um centro de estudos e pesquisa, o Savitri Bhavan, onde se podem conhecer o trabalho e a visão do guru e da Mãe. Apesar do tom esotérico, essa busca pela consciência não se atém a uma religião. Aliás, a proposta é a não religião que abriga todas as formas de fé sem impor nenhuma. Há abertura para todos os homens de sabedoria, mas não se deve limitar a uma tradição religiosa. Não há gurus nem dogmas. "A Mãe é uma inspiração. Porém, a responsabilidade de nossas próprias ações é individual", afirma Schultz.

Visitar o Matrimandir evidencia esse valor. A construção em forma de esfera, dourada, é um templo sem deuses, silencioso, que concentra uma energia feminina ligada à força da criação e a valores como compaixão, leveza e amorosidade. O único barulho é o da água corrente, que embala a meditação, prática hinduísta adotada como canal de autoconhecimento. "Para ser livre é importante entrar em contato consigo mesmo", diz Schultz.

DESAFIOS
Calma, mas conectada, a comunidade imaginada pelo mestre está em perfeita sintonia com a tecnologia, o design e a inteligência do mundo contemporâneo. Há um estímulo especial a práticas sustentáveis, como o uso de bambu na arquitetura e a ampliação das diferentes formas de energia solar. Desde sempre foi assim. Basta lembrar que o local onde a cidade foi construída estava severamente erodido. A primeira fase da implantação do projeto se limitou a recuperar o terreno e a flora devastada. Muitos quilômetros de floresta foram replantados, a fauna foi reintroduzida, o uso sustentável de água e energia virou prática, e há uma campanha constante para reciclagem e redução dos resíduos. Nas escolas - são seis, atendendo crianças de todas as vilas -, a pedagogia da livre escolha permite optar por matérias, de modo que cada aluno descubra seu potencial. Esportes e arte são altamente valorizados.

Apesar das concepções que regem a comunidade, Auroville enfrenta as mesmas questões de outras cidades do mundo. Surpreendentemente, há vestígios de violência e destruição. E há quem chegue ali apenas para espiar. "Tem pessoas que vêm aqui para fugir do mundo, tem aquelas que não querem assumir responsabilidades, que não acreditam no trabalho, tem as angustiadas...", diz Schultz. "Ao mesmo tempo, há almas com propósitos elevados." Criada para abrigar 50 mil pessoas, até hoje não tem infraestrutura para receber tanta gente. O sonho de Aurobindo caminha lentamente, dependente de doações do governo da Índia, de ONGs e de pessoas de boa vontade. Para os otimistas, como a designer Ruth Reis, esses passos vagarosos representam uma nova percepção global. Ela enaltece a cidade-laboratório, em que se experimentam novos modelos de convivência e de vida urbana, tão necessários ante a falência em que as cidades se encontram.

Fonte; Cidade Sustentável

Nenhum comentário:

Postar um comentário